Voltando a Sala do Dr. BOB
- Plinio P.S Benfica
- 22 de nov. de 2016
- 8 min de leitura

Em 1940 as taxas de sucesso de A.A. ficavam em torno de 50% a 75%, hoje mais de setenta anos depois estas taxas mal alcançam 10% (tanto em A.A. quanto em N.A.). Muitas coisas podem ter acontecido, mas é possivel que algo fundamental tenha se quebrado. Estes baixos índices de recuperação podem ser resultado de uma forma distorcida, pobre e ineficaz de apadrinhamento.
O primeiro texto a ser escrito sobre a forma como o programa de 12 passos funciona foi a literatura de A.A., mais especificamente o que chamam de “Grande Livro”. Apesar de nas suas primeiras 187 páginas ele não fazer recomendação alguma ao recém chegado ou a qualquer outro membro sobre a necessidade de ter um padrinho, todo o texto tenta implicitamente responder a pergunta: O que o Grande Livro mostra na maioria de suas páginas? A resposta é obvia: alcoólicos trabalhando com outros alcoólicos. E, ao trabalhar com outro alcoólico, eles estão colocando o programa de A. A. em ação. O texto fala de apadrinhamento mesmo quando não está escrito a palava apadrinhamento.
A todo momento nas conversas entre membros de A.A. e N.A., ou nas salas de reuniões são faladas frases como estas, "Fale com seu padrinho todos os dias", "não tome nenhuma decisão até que você fale com o seu padrinho". Se formos procurar entender a mensagem original que Bill tentou comunicar no texto do “Grande Livro”. Logo descobriremos que estas podem não ser boas estratégias para ajudar o recém-chegado a se recuperar. Estas parecem mais mensagens sobre o quão dependentes estes recém chegados estão do aconselhamento de seus padrinhos. Na verdade a maioria são instruções sobre questões médicas, psicológicas, financeiras, legais e de relacionamento. Alguns literalmente não vão tomar qualquer decisão sobre qualquer coisa até que falem com seus padrinhos. Isto não é compatível com o método que Bill revela no capitulo do Grande Livro intitulado “como funciona”. Isto parece mais uma estratégia de criar membros codependentes de seus padrinhos, incapazes de funcionar de forma independente, e que a todo momento tem que beijar a mão do padrinho para pedir orientação e permissão para agir.
Bill W. escreve: "Apesar de trezentos mil se recuperaram nos últimos vinte e cinco anos, talvez meio milhão ou mais passaram por nossas salas mais de uma vez. Não podemos contentar-nos com a visão de que a culpa seja inteiramente dos recém chegados. Talvez um grande número não recebeu o tipo e a quantidade de apadrinhamento que necessitavam. Nós não soubemos nos comunicar quando poderíamos ter feito isso. Então, nós de A.A. falhamos. " (A.A. Grapevine. O dilema de Sem Fé. 1961. Vo. 17 No. 17).
Como é importante para o membro de A. A. o trabalho com o recém-chegados? No Grande Livro está escrito: "A experiência prática demonstra que nada garantirá tanta imunidade contra o álcool como o trabalho intensivo junto a outros alcoólicos. Quando outras atividades não resolvem, isto funciona. Esta é a nossa décima segunda sugestão: Leve esta mensagem a outros alcoólicos! Você pode ajudar quando ninguém mais puder. Você pode obter a confiança deles, quando as outras pessoas não conseguirem. Lembre-se que eles estão muito doentes. " (Alcoólicos Anônimos. página 109).
Qual é a função do Grande Livro? Literalmente é "Demonstrar a outros alcoólicos exatamente como nos recuperamos é o principal objetivo deste livro. Por eles, esperamos que estas páginas sejam tão convincentes que nenhuma prova adicional seja necessária." (Prefácio da primeira Edição de Alcoólicos Anônimos, página 09).Estratégias equivocadas que induzem a codependência não é apadrinhamento. Talvez este tipo de apadrinhamento somente seja menos pior do que o auto apadrinhamento. A ideia básica é simples, primeiro o recém chegado precisa de alguém para sentar com ele e mostrar como trabalhar os passos. Depois de trabalhar os passos, ele deve ser incentivado a mostrar aos outros recém chegados como trabalhar passos. Então, apadrinhar é ensinar aos outros como trabalhar os Doze Passos e também como ensina-los a ensinar os outros a trabalhar os Doze Passos. Ocasionalmente, o afilhado chama o padrinho que lhe mostrou "Como Funciona" para rever o Passo Cinco ou para discutir abordagens do Passo Nove, mas principalmente para falar sobre o trabalho com os recém-chegados. Bill W. Sempre resaltou a necessidade de práticas como o inventário moral, a confissão dos defeitos de caráter, as reparações as pessoas prejudicadas, tornar-se útil aos outros, e a necessidade de crença e entrega a um Poder Superior. " Apadrinhar é ensinar o afilhado a criar um estilo de vida que inclui hábitos de recuperação como por exemplo: À noite depois de fazer o inventário diário e pedir perdão de Deus (se o concebe ou na forma que concebe) e desenvolver as medidas corretivas para o dia de amanhã. De manhã (baseado nos planos da noite anterior), o adicto / alcoolatra pede ao Poder Superior para dirigir seu pensamento, especialmente pra enfrentar a auto-piedade, a desonestidade e o egoísmo. Durante o dia, pode haver momentos de indecisão. Pode ser que o recém chegado ainda não tenha desenvolvido a habilidade de lidar com situações inesperadas. Então é preciso que o padrinho lhe ensine a fazer a meditação e a oração como uma resposta rápida para cuidar destes eventuais problemas. Controlando a mnhã o dia e a noite, está criando um ambiente de sanidade.É interessante se perguntar, quando é que um recém chegado deixa de ser um recém chegado? Pela idéia original de Bill a resposta não está ligada ao tempo em que ele pertence ao grupo. Evidentemente a partir do momento que ele domina a pratica dos passos ao ponto de levar esta mensagem a outro ele deixa de ser um recém chegado.O Dr. Silkworth foi um especialista em alcoolismo e médico de Bill W. Segundo ele durante o sua terceira tentativa de tratamento, Bill desenvolveu certas idéias sobre um possível método de recuperação. Baseado nisto, como parte de sua reabilitação, ele começou a apresentar estas concepções a outros alcoólicos, partilhando como eles deveriam fazer para se recuperar. Na década de quarenta, os grupos de A. A.s ofereciam reuniões para iniciantes em ambientes seguros e estruturados, onde os recém-chegados eram apresentados aos doze passos. Nestas reuniões afilhados que já tinham passado pela experiência também aprendiam como apadrinhar. Um grupo de recém chegados muitas vezes eram apadrinhados por dois ou mais membros de A. A.. O padrinho e seu(s) aprendiz(es). O termo utilizado a época foi co-apadrinhamento. Um membro de A.A. chamado Wally P., escreveu um livro chamado "Back to Basics: Os Alcoólicos Anônimos e as reuniões de Iniciantes” para escreve-lo entrevistou muitos dos membros de A.A. pioneiros da década de quarenta e descobriu algumas coisas sobre o apadrinhamento desta época:
1. Barreiras colocadas entre o recém-chegado e os Doze Passos. A ajuda ao recém-chegado começava por conduzi-lo direto ao Passo Doze tão rapidamente quanto possível, isto era feito para que eles (rece-chegados) pudessem experimentar o despertar espiritual decorrente da mudança de vida que ocorre do resultado direto de tomar estas medidas. Outra medida era tranquilizar o recém-chegado informando que ao aderir ao programa de doze passos iria ter alívio de sua adicção / alcoolismo. Na época também mostravam ao recém-chegado que o processo era simples e direto e que realmente funciona. O programa leva apenas algumas horas ou no máximo uma semana para ser aprendido. Bill W. começou a trabalhar com outros alcoólicos, logo que ele terminou seu último tratamento que foi uma estadia de 5 a 7 dias no hospital na década de trinta. Bill tinha trabalhado duro com muitos alcoólicos sobre a teoria de que apenas um alcoólatra poderia ajudar outro alcoólatra, mas ele de fato, só conseguiu manter sóbrio a si mesmo. De repente, ele percebeu que, a fim de se salvar, deveria levar sua mensagem a outro alcoólico. Assim, os dois primeiros membros de A.A. (Bill W. e Dr. Bob), após terem conversado pela primeira vez na casa de Bob (Bob entrou em recuperação após esta conversa) começaram a trabalhar quase que freneticamente abordando alcoólicos que chegavam na enfermaria do Hospital da Cidade Akron. Na verdade, ao que parece as reuniões de grupos anônimos são uma tentativa de reproduzir em larga escala aquele primeiro encontro na casa do Dr. Bob.
2. É da responsabilidade do padrinho procurar o recém-chegado. Talvez por isto o nome seja apadrinhamento caso contrário seria afilhadamento. O padrinho deve tomar regularmente a iniciativa em relação ao recém-chegado. Lembre-se, o recém-chegado é muito doente e precisa de incentivo e apoio. Já ouvi muitos padrinhos dizer a seus afilhados para chamá-los todos os dias como uma forma de demonstrar a sua vontade e, se não fizer isso, eles são dispensados por seus padrinhos. É compreensível a noção de tentar medir a disposição do recém-chegado, entretanto, medir a disposição do recém-chegado pela sua capacidade diária de telefonar é como um médico que diz ao seu paciente, "você tem uma doença terminal e eu preciso tratá-lo diariamente, então você deve me chamar diariamente para ter certeza que eu lhe darei o remédio. Naturalmente, essa não é a foma como funciona. O médico percebe que o paciente está doente e é o médico que regularmente toma a iniciativa para ver se seu remédio está sendo administrado. Da mesma forma, o adicto / alcoólico em sofrimento. Sua mente e seu corpo estão doentes. É responsabilidade dos padrinhos acessar o recém-chegado, para garantir que ele receba a solução para se recuperar. Mais do que isto, a prática do rograma consiste em tomar a iniciativa de apadrinhar. E o resultado decorre desta prática.
3. Ler as partes apropriadas do "texto básico" para o recém-chegado. Na maioria das vezes o recém-chegado não está em condições físicas ou emocionais para ler, ou mesmo para compreender a mensagem. Portanto, ler e explicar as partes apropriadas do livro para o recém-chegado, especificamente aquelas 50 ou mais passagens que se referem diretamente a prática dos Doze Passos. Existe uma abordagem denominada de "rústica" que foi desenvolvida no início de 1990 em uma antiga comunidade de Toronto. O foco dela é o Grande livro (eles não usam nenhum outro texto). A ênfase é sobre as primeiras paginas (até página 103), que não foram alteradas desde sua publicação em 1939. Este processo de um adicto / alcoólatra guiando outro através do livro leva em média 24 a 30 horas e geralmente é feita em duas ou três encontros de uma hora, tipicamente durante um período de 2 ou 3 semanas. Neste processo, as palavras “recém chegados” são circuladas com canetas e outras passagens em destaque recebem comentários e notas escritas na margem do livro. É por estas práticas que eles foram apelidados de “rústicos”, porque “estragam” o livro! Durante este período o indivíduo efetua de fato os primeiros onze passos do programa. Ao ensinar o método "rústico" a outros recém-chegados é que ele completa Passo Doze.
4. A recuperação está na partilha e não na escrita. É necessário sentar-se com o recém-chegado e orientá-lo durante e através do inventário do Quarto Passo. Se necessário, escreva o inventário, enquanto o recém-chegado o fala. Isso ajudará a aliviar qualquer ansiedade ou apreensão que ele pode ter a respeito deste passo. Muitas vezes o padrinho fala para o afilhado fazer o inventário. A maioria dos adictos / alcoólatras são muito nervosos, doentes ou tem muito medo para olhar a “carnificina moral” do passado. Ao fazer a jornada dos Passos Quatro e Cinco juntos, tanto o padrinho quanto o recém-chegado podem descobrir os defeitos de caráter e avançar de forma eficiente para os passos seis e sete.
5. O padrinho deve auxiliar o recém-chegado com as reparações. Ao trabalhar juntos as reparações do recém-chegado, o padrinho deveria ser a primeira pessoa que ele deveria ver depois de ter feito as pazes com alguém.
6. O padrinho deve orientar a ação do recém-chegado. Esta orientação não é diretamente sobre o problema. Mas, sobre a pratica do Passo três e sete, encorajando-os a meditar sobre as respostas ao invés de recorrer ao padrinho para este lhe dê soluções e conselhos.
7. Co-apadrinhar o próximo recém-chegado. É uma intervenção muito importante e eficiente levar o afilhado para trabalhar com o próximo recém chegado. Desta forma, o afilhado vai ganhar confiança em sua capacidade de guiar os outros através do processo de recuperação. Clarence S. um dos fundadores do A.A. de Cleveland, Ohio, escreveu em um panfleto sobre o apadrinhamento em A. A. Nele descreve que muitas das informações para apadrinhar podem ser obtidas a partir da experiência de membros mais antigos neste trabalho. Um co-padrinho (mais novo), acompanhado de um membro mais experiente pode comunicar o que a literatura não consegue.
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