MANIPULAÇÃO BASEADA NA RECUPERAÇÃO
- Plinio de P. S. Benfica.
- 18 de jan. de 2017
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A manipulação baseada na recuperação pode ser definida como o exercício de influenciar indevidamente outra pessoa através da distorção de ferramentas ou informações da recuperação. Os objetivos dos manipuladores podem variar entre: tomar o poder, controlar a vida dos outros, obter benefícios ou privilégios ou defender-se. A influência saudável que ocorre entre pessoas que se encontram no mesmo caminho de mudança é diferente da manipulação. A Influência saudável ocorre e deve ocorrer entre a maioria das pessoas, faz parte do dar e receber que compõem as relações dos que estão em recuperação. Já nos relacionamentos onde existe a manipulação, uma pessoa usa a outra como se fosse um objeto para obter benefícios. Deliberadamente o manipulador se utiliza da distorção de ferramentas da recuperação para explorar a vítima e tirar vantagens, provocando na relação um desequilíbrio de poder. Este desequilíbrio ocorre porque o poder vai paulatinamente sendo acumulado pelo manipulador ao mesmo tempo que é retirado das mãos do manipulado. Em um ambiente que deveria ser oxigenado de aceitação, auto aceitação e entrega, vemos adictos e familiares utilizarem as ferramentas de recuperação hora como espada para ferir os outros, hora como escudo que os impedem de mudar. Abaixo há uma lista de quatorze artifícios que os manipuladores em recuperação costumam usar para colocar os outros em uma posição de desvantagem. Entretanto, uma observação precisa ser feita, nem todas as pessoas que apresentam estes comportamentos podem ser chamadas de manipuladoras. Isto porque algumas delas simplesmente desenvolveram maus hábitos. Independentemente disso, é importante reconhecer esses comportamentos em situações em que seus direitos, interesses e segurança estão em jogo. 1 - Os “territórios” da manipulação.
Uma pessoa tem maior propensão a ser manipulada se no momento do ataque ele (a) estiver no território do manipulador. O indivíduo manipulador pode insistir em conversar no quarto dele(a). Ou seja, em um espaço físico onde ele ou ela pode exercer mais domínio e controle. Isto pode ser o escritório do manipulador, a casa, o carro, ou outros espaços onde ele sente dono e ou possui familiaridade. Quando uma pessoa descobre que é vítima sistemática de manipulações, quase sempre, logo após também descobre que o manipulador está psicologicamente se apoderando dos territórios. Criar territórios implica em criar direitos. Por exemplo, muitas famílias de adictos cedem os quartos de suas casas para eles morem, e logo ele o chama (e a família também) de meu quarto. E o processo vai tomando corpo. “Meu carro, minha casa, minha família”.
Isto pode não ser apenas um vício de linguagem. No caso dos manipuladores é uma forma de domínio territorial. A recuperação impõe mudanças nos papéis desempenhados, tanto pelos familiares quanto pelos adictos. Ampliar, recuperar e marcar territórios faz parte desta mudança, ocorre que algumas pessoas querem se valer do fato de estarem em recuperação para invadir estes espaços. 2 - Os pontos fracos da recuperação.
A convivência faz com que as pessoas conheçam os pontos fracos umas das outras. Partindo do princípio que as recuperações estão dentro da condição imperfeita do ser humano. Existe um tipo muito comum de manipulação chamada de crítica manipuladora. Como o próprio nome diz, ela se baseia na utilização de críticas (verdadeiras ou não) para pressionar outras pessoas a fazerem as vontades do manipulador. Este tipo de manipulação possui dois componentes. O primeiro é o conteúdo crítico. O segundo é o objetivo real. Este segundo componente sempre estará estrategicamente escondido. Enquanto o manipulado se perde na tentativa de entender ou se defender da crítica, o manipulador habilidosamente o conduz para o objetivo. Portanto, duas pessoas que possuem o mesmo objetivo conseguem manipular utilizando as críticas direcionadas aos pontos fracos da recuperação do outro. Muitas vezes este comportamento fica sob um manto da crítica construtiva. A crítica construtiva existe, mas somente quando não há a intenção de dominar e direcionar o outro a satisfazer a vontade do manipulador.
3 - Inversão de valores.
Neste caso também existe a presença da crítica manipuladora. Ela não se apresenta como uma cobrança dos erros cometidos, mas na indução ao relaxamento e a indiferença da prática ou da condição moral do outro. O fato é que existem indivíduos que se sentem incomodados em conviver com o crescimento moral dos outros e protestam de valores tais como a honestidade, a paciência, a aceitação ou com comportamentos de pontualidade e frequência ao grupo. Sempre estão repetindo o mantra de que não estão ali para serem santos. Exaltam a importância da esperteza como um modo de vida, e justificam erros como uma maneira de evitar serem enganados pelos outros. É uma forma de culpar a vítima por causar sua própria vitimização.
4 - Impressionar o outro com conhecimento sobre recuperação.
Alguns indivíduos promovem o “bullying intelectual”. Tomando a postura de “especialistas”, estes conhecimentos podem ser empíricos (prática) ou sobre literatura de recuperação. Eles manipulam impondo fatos e experiências pessoais recheadas de citações de passagens das literaturas. Se utilizam destes artifícios com pessoas que não dominam o assunto, supostamente para ajudar. Mas na verdade querem impressionar para depois dominar. Este tipo de manipulação pode estar presente em questões das mais diversas. Ao presumir que pode dominar com o poder do “especialista”, o manipulador espera submeter de forma mais convincente os outros a sua vontade. Algumas pessoas usam esta técnica sem outra razão senão a de sentir-se intelectualmente superiores.
5 - Impressionar o outro com “o drama da recuperação”
Certas pessoas usam o “drama da recuperação”. Isto consiste em histórias recheadas de sofrimento e intervenções do Poder Superior, que servem para demonstrar como a sua recuperação é sofrida e especial. Podem ocorrer em conversas na hora do cafezinho ou em partilhas em uma reunião de grupo anônimo. São as conhecidas “partilhas show”. Isto serve para manter sua posição e poder. Na verdade, a coisa toda é bem simples. A pessoa senta na cadeira, escuta as partilhas e se quiser levanta a mão e continua voltando. Este tipo de manipulação baseada em histórias fantásticas cria e reforça fantasias e mitos sobre recuperações especiais. Elas promovem um tipo de pirotecnia que possibilita a manipulação. A empatia é o que funciona, ao contrário do drama da recuperação as pessoas não se recuperam porque admiram as partilhas show. Apesar deles produzirem um divertimento, a verdadeira atração não funciona através de efeitos especiais.
6 - Impressionar o outro com a quantidade de tempo limpo.
Algumas pessoas usam seu tempo limpo para manipular. Eles fazem parecer que muitos anos de recuperação representam sucesso e que poucos anos são insignificantes. Criam de forma velada uma hierarquia onde as pessoas com mais tempo limpo são superiores as pessoas com menos tempo. Esta é uma boa estratégia manipuladora para ganhar uma vantagem psicológica. Seu lema é “você é um recém-chegado até que complete 10 anos”.
7 - Falso sofrimento.
Pedir ajuda é uma forma bastante eficiente de manipular. Produzir uma atmosfera de necessidade e vitimização cria um espaço para existência de um herói. Esta é a tática clássica para fazer com que os manipulados deem atenção e passem a satisfazer exigências silenciosas em nome da ajuda ao próximo. São pessoas que não mudam não importa quanto tempo e esforço sejam dedicados a elas. Isto acontece porque o mais importante não é a mudança, e sim receber ajuda e atenção. O propósito desta manipulação é explorar a boa vontade do manipulado através de produzir culpa, senso de dever e senso de obrigação, instinto protetor e nutridor, a fim de extrair benefícios e concessões não razoáveis. Exemplos: Problemas pessoais ou de saúde exagerados ou imaginários. Mostrar fragilidade para suscitar simpatia e favores.
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